quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

A fase das emoções e a carreira


Resultado de imagem para centauro mitologia em aquarela

O quarto setênio refere-se ao período dos 21 aos 28 anos. É a fase da experimentação, oportunidade de sentir o que atrai profissionalmente. É o momento também em que o jovem ingressa inteiramente no mundo dos adultos, assumindo mais responsabilidades e escolhas.   
O centauro é o arquétipo trazido pelos gregos para representar este ciclo, o símbolo metade homem e metade cavalo, evidência a necessidade de aprendizagem das emoções.   
Há aqui energia, vitalidade, conhecimentos adquiridos através de leituras, cursos, faculdade e existe também um grande espaço para a prática de habilidades técnicas.
Por um outro lado, o domínio do conteúdo técnico não é suficiente por si só, há um desafio para equilibrar os altos e baixos das emoções, gerada por uma instabilidade emocional que precisa ser cuidada.
Enxergo que a importância da inteligência emocional vai ficando ainda mais forte atualmente, considerando que cada vez mais cedo jovens estão empreendendo e assumindo posições que lhe demandam mais e mais, em seus próprios negócios, empresas tradicionais e startups.   
Ter projetos com resultados mensuráveis contribui para que o jovem vá se apropriando de seu desempenho, o que vai ganhando ainda mais potência com o apoio de um outro profissional que possa ir lhe dando orientações técnicas e comportamentais.
É comum a insegurança e uma maior fragilidade diante de críticas, por isto feedbacks conduzidos com assertividade por meio de uma comunicação não violenta, contribuem para dar mais clareza ao profissional, o que vai trazendo de forma gradativa mais segurança interna.   
O feedback é uma forma de comunicar os acertos e melhorias, o que na verdade é importante em todas fases, mas nesta ainda mais, pois traz um norte, uma referência de que caminho seguir, como uma bússola para um viajante que necessita de direção.
O final deste setênio, é marcado por uma crise interior, chamada de crise dos talentos, o qual cada um vivenciará com uma intensidade e de uma forma. Esta crise vem como uma oportunidade para olhar para os talentos com mais consciência e vem acompanhado por uma pergunta:
O que eu faço com os meus talentos daqui para frente?
Cada fase da vida vivenciamos uma grande questão, esta é a que permeia os 28 anos.
Minha crise dos talentos aconteceu enquanto eu trabalhava como funcionária no meio organizacional, comecei a sentir uma grande insatisfação, pois tinha percepção que minha inquietação não se resolveria indo para uma nova empresa. Era algo mais profundo, eu precisava me reencontrar,  relembrar por que eu havia escolhido psicologia como formação, quais talentos eu tinha e como poderia usá-los, mas talvez de uma nova forma. Foi um momento de dúvida e que bom que eu vivi esta crise, me permitiu fazer novas escolhas na minha carreira.
Para fechar este texto, gostaria de compartilhar uma parábola que descreve muito bem a importância dos talentos.
“Um senhor tinha três servos, aos quais deu dez talentos (moedas de prata); dez para cada um. O primeiro esbanjou o dinheiro; o segundo enterrou o dinheiro; e o terceiro o aplicou. Após um ano, os três voltaram ao senhor: o primeiro, de mãos vazias; o segundo desenterrou o dinheiro e voltou com a mesma quantia; e o terceiro, que aplicou o dinheiro, voltou com uma quantia bem maior”.
E você, como está aplicando seus talentos?

Andressa Miiashiro
Psicóloga e psicodramatista

www.lotustalentos.com.br

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

"ECCE HOMO" ("Eis o Homem")




Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma de nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo de travessia, e se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.”
Fernando Pessoa


Neste setênio há uma marca importante: o fim da fase do crescimento corporal. Aqui começa a autoeducação. Até aqui, com o corpo físico em crescimento, o Homem está aberto, pois para crescer precisa ter espaço. Este espaço permite que a educação ocorra de fora para dentro.

Com o término do crescimento físico, o “fechamento” do esqueleto, ocorre uma nova situação. Agora, não é mais possível educar de fora. Se tudo deu certo, toda informação que entrar será avaliada pelo Eu. Então o que se vê agora não é mais um jovem, mas um adulto, com opiniões próprias, escolhas pessoais e atitudes individuais.
Este processo é lento e vai se consolidar neste setênio. Esta é a tônica desta época na biografia humana.

O Homem agora se emancipa da educação que herdou. Ele tem agora um corpo adulto e uma bagagem pessoal, que foi a educação que recebeu até então. Com a perda do último invólucro, o do Eu, se inicia a manifestação plena do mesmo, que começa neste ponto a verdadeiramente se formar. A individualidade. Esta parte suprassensível do ser humano, agora desperta com toda sua força.

Se até então a criança estava dentro de casa e da escola e o jovem estava meio-fora e meio-dentro, treinando olhar o mundo exterior, agora o novo adulto estará especialmente sensível ao mundo de fora.

É o momento onde ele começa a questionar se os valores recebidos tem conexão com seu Eu e se a educação que recebeu faz sentido para ele. É uma época de profundos questionamentos, o que deixa o novo adulto vulnerável às informações, pois ele está mais propenso a negar os valores e a educação recebidos, na busca de sua própria identidade. É um momento crucial onde também pode ocorrer uma ligação demasiadamente forte com valores diferentes dos seus originais. Ele reflete sobre o que herdou, se sua bagagem serve aos seus propósitos de vida. É momento dele fazer um balanço, para ver o que fica e o que se vai, na construção de sua identidade adulta.

Neste ponto, o Eu se liberou do trabalho com o corpo físico e agora se ocupa com a constituição de sua Alma. A Alma é o instrumento pelo qual o Homem se manifesta no mundo. É Ela quem dá notícias ao mundo sobre a individualidade que ali está e que agora, neste setênio, se manifesta mais plenamente. Este é o momento biográfico que pode ser traduzido como um segundo nascimento. Ao nascermos, nasce a promessa de uma individualidade. Aos 21, ela se torna presente.

Os fenômenos que serão percebidos neste setênio, na vida prática, serão aqueles relacionados com a formação de uma base estrutural como plataforma de lançamento para o próximo setênio. São eles: formação universitária, colocação profissional, consolidação dos relacionamentos amorosos, constituição de uma nova família, obtenção de recursos financeiros.

Fica evidente que neste momento o novo adulto prepara seu novo ninho, com sua marca pessoal, e vai em busca de recursos materiais para consolidar sua tarefa e, mais tarde, concretizar sua missão de vida.

O Homem é um cidadão de dois mundos, o celeste e o terrestre. A vida é como uma conversa ou um encontro destas duas forças. A partir dos 21 anos, aquele Eu que desejou passar pela experiência terrestre finalmente pode expressar, com liberdade e verdade, aquilo que veio manifestar no mundo físico. Dádiva!


Anahi Noppeney

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

O Eu – a independência e a crise de talento


Nascimento do Eu, momento de direcionar nossos desejos.
Nesta fase nossas emoções oscilam muito. Somos muito sensíveis as críticas, tanto positivas quanto negativas.
Temos que fazer uma reflexão sobre “como eu vivencio o mundo”?
Nesta fase estamos numa grande fase de experimentação, principalmente de limites.
O ser humano, nesta fase, depende muito da aprovação de fora, e funciona em altos e baixos, deixando-se influenciar pelo externo, e a luta é não se deixar impregnar demasiadamente, paralisar ou impedir-se de viver emoções - neste período a vida está para isto. São momentos fortes, onde temos que pesar e refletir sobre o que herdamos, olhar para o que ganhamos e o que temos, e avaliar deste patamar o que serve aos nossos propósitos de vida, o que devemos incrementar e do que podemos abrir mão – valores que nos serviam até então, mas que a partir de agora podem impedir nossa própria evolução, assim como uma roupa fora de moda, que não combina ou não cabe mais.
Olhando o que recebemos, devemos avaliar o que pode e o que deve ser mudado em favor do nosso próprio caminhar.

A Crise dos Talentos
No quarto setênio, dos 21 anos aos 28 anos, experimentamos a "crise dos talentos". É quando buscamos novas experiências exteriores como: viajar e estudar fora, enfrentamos o dilema da profissão ideal e daí vai surgindo o desejo de independência, de sair dos padrões já apreendidos e conhecidos e arriscar os próprios valores internalizados.
Aos 21 anos, o “Eu” começa realmente a se formar. Uma parte suprassensível do ser humano, mais exterior, é acordada, e é aquela que está em contato com o mundo exterior – e por isso mesmo, muito mais impressionável por ele.
Nossa história começa a ser traçada, pois começamos a trilhar nosso caminho, fazendo escolhas. Escolher uma profissão, um parceiro(a). Inicia-se uma fase de emancipação em todos os níveis, tendo como pano de fundo as experiências dos três primeiros setênios anteriores.
Comigo as crises profissionais me ajudaram a crescer e me desenvolver quando dentro da própria Psicologia fui escolhendo outras áreas de atuação. No final da faculdade e no início da minha vida profissional atuava como acompanhante terapêutica (A.T.) de pacientes graves e psicóticos. Após alguns questionamentos fui me especializar e trabalhar em atendimento a crianças vítimas de violência física e sexual e fui me interessando muito pelo cuidado da infância. Aí me casei, engravidei, minha primeira filha nasceu.  Após o nascimento dela veio a dúvida em qual escola devo colocá-la? Pesquisei bastante até chegar na escola Waldorf, algo completamente novo para mim, pois minhas referências familiares foram marcadas por opções tradicionais. E foi a partir de então que conheci a Antroposofia e muita coisa mudou e uma maior compreensão da vida e de seus processos abriu-se para mim.

Flavia N. De Domenico

flavia.domenico@gmail.com

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

O despertar do Ser único no mundo


Aos 21 anos se dá o nascimento da alma individualizada.
Até esse momento, o EU estava tomado pela construção do instrumento físico, o corpo, agora, a partir dos 21 anos, o EU está focado no amadurecimento psíquico.
Neste 4º setênio, que se dá dos 21 aos 28 anos, aflora-se nossas emoções e sensações. É a fase que nomeamos, metaforicamente, como centauro, aquela imagem da mitologia que é metade homem e metade cavalo, passando a ideia de que somos o cavaleiro na vida, que vai aprendendo a puxar e controlar as rédeas de seu cavalo ainda bravo.
É uma fase de muita experimentação. Caímos e levantamos psicologicamente, tal como acontece com a criança que está aprendendo a andar.
Momento importante para aprender experimentando, acertando e errando, correndo riscos.
Somos tomados por ideias e acreditamos que tudo é possível, inclusive mudar o mundo.
O eu quer aparecer, brilhar, mas também sofre por ainda estar muito preso às expectativas dos outros em relação aos papéis que exerce na vida (como a boa filha, o bom profissional...), que seriam as máscaras / personas desenvolvidas, apresentando ainda uma grande necessidade de aceitação social.
Nessa fase, muitas pessoas que tiveram oportunidade, geralmente estão saindo da faculdade, conquistando seu papel profissional e novas habilidades técnicas. Aprendendo a lidar com chefes, a criar novos círculos sociais...alguns já casaram e até já tem filhos.
Falando um pouco de mim nessa fase...
Com 22 anos me formei em psicologia pela Universidade federal do Espírito Santo. Tive meu primeiro emprego depois de formada e também uma demissão, que resultou em mudança de rota e minha ida para Índia, onde fiquei por 1 ano. No retorno da Índia, mudei de Vitória para São Paulo, trabalhei em duas empresas diferentes, aprimorei minhas habilidades técnicas na área de Desenvolvimento de Pessoas e Organizações. Me casei. Aumentei muito meu círculo de amizades e conhecimento. Foi realmente um período de viver muito o mundo, de me experimentar, arriscar, desbravar novos mundos e desenvolver novas habilidades. Percebo como um período crucial da construção da minha biografia e sou muito grata por ter tido todas essas oportunidades que me permitiram viver esse setênio na sua maior potência. Se eu pudesse falar desse período através de uma cor, escolheria a cor verde, que me lembra assertividade, ação e tomada de decisão.
A vivência de cada setênio pode mudar de acordo com a realidade e os privilégios que cada um tem, mas de uma forma geral, os 21 aos 28 anos é uma fase na qual as pessoas vão mais para o mundo com a sua mochila nas costas.
E se torna um momento muito importante para olhar para o que se tem nessa mochila.
O que carregamos da nossa infância e adolescência.
Aqui começa a ser escrita a biografia interna (o que realmente desejamos, intuímos, queremos realizar) e a biografia externa (o que a vida exige de nós).
Adquirimos a nossa “maioridade”, a capacidade plena de assumir responsabilidade na vida.
Hora de libertar-se dos padrões, principalmente os paterno e materno que recebemos pela educação, saindo do lugar da criança e de relação de dependência e nos colocarmos no lugar de adulto e responsável pela própria história.
Hora de olhar para as pedras preciosas que carregamos, como valores, talentos e aprendizados, e também para os objetos pesados que trazemos que não nos servem mais, como crenças e rótulos que nos limitam, aprendidos principalmente no 2º setênio (7 aos 14 anos), e que agora podemos deixar ir.
E você, já parou para revisitar esse seu setênio? Como você vivenciou ou tem vivenciado o mundo dos 21 aos 28 anos? Qual cor tem esse seu período? O que tem/tinha na sua mochila? Como a sua alma está mostrando a sua individualização no mundo?

Marcela Lempé Madruga
Psicóloga e Coach

Facilitadora do desenvolvimento humano, apaixonada por autoconhecimento e experiências que ampliem a consciência. Mais sobre mim: www.essenciadesenvolvimento.com.br / https://medium.com/@marcelalempe

sábado, 1 de dezembro de 2018

O AMOR E O IMPULSO DO CRISTO


“O amor é o calor que aquece a alma”
                                          Nando Reis
Os atos de amor que nós praticamos devem estar, intrinsicamente ligados, ao Impulso do Cristo.
Mas o que significa este impulso quando a humanidade estava em perigo em relação à sua evolução, pois havia se voltado para as forças egoístas Luciféricas, o próprio Cristo, Ser Divino vem a Terra e realiza o grande ato de Amor físico – espiritual puro e sincero voluntariamente, o Mistério do Gólgota, ou melhor, sua condenação à morte por cruz injustamente.
Este ato de Amor que fluiu do Cristo permitiu novamente que a humanidade pudesse voltar ao caudal da evolução, mas para isso ela também tem que praticar atos voluntários, a partir deste Impulso do Cristo, realizar atos de Amor em plena liberdade sem exigir compensação.
Estes atos de Amor quando praticados por nós seres humanos, a partir deste Impulso do Cristo, geram no Mundo forças criadoras, germinativas que ficam no devir Cósmico Espiritual.
Assim, tais atos não podem ser levados por nós entre a morte e o novo nascimento para compensação em uma nova existência, a partir desta sabedoria, que está inconsciente na mente e no coração dos homens,  fundamenta a falta de atos de amor no mundo.
O Mundo hoje é carecedor de Atos de Amor, pois todos nós queremos praticar tais atos, mas também queremos a sua contrapartida, isto é, nós somos ainda, passados mais de 2000 anos do Grande Ato de Amor do Cristo, egoístas.
Mas como podemos identificar estes atos de Amor a partir do Impulso do Cristo?
Uma pessoa que nada sabe sobre os Evangelhos, nem tampouco sobre o Mistério do Gólgota ou Cristo, mas que tem plena consciência que quando pratica um ato em liberdade, seja em que âmbito da vida for, e não esperar a devida compensação, sem vislumbrar vantagens no seu futuro, esta pessoa pode ser chamada de verdadeiro Cristão, pois praticou o ato em consonância com o Impulso Crístico, um ato de Amor.
Não podemos praticar atos a partir de um peso, uma obrigação ou compensação, mesmo em nosso trabalho cotidiano, trabalhamos para receber um salário, ou podemos empregar o Impulso do Cristo nos nossos afazeres profissionais e domésticos, e realizá-los a partir do amor que empregarmos e sermos verdadeiramente Livres.
Como disse Rudolf Steiner em seu livro A Filosofia da Liberdade, “Viver em amor com as próprias ações e deixar viver em plena compreensão da vontade alheia é a máxima dos homens livres.” E também na GA 143; O amor e seu significado no mundo, Cristo, que surgiu dos mundos espirituais, uniu sabedoria ao amor; ele superará o egoísmo, pois esta é a sua meta. Mas o amor deve ser oferecido independentemente, livremente, de ser para ser:”
Assim, devemos nesta época da alma da consciência, praticar cada vez mais atos a partir deste Impulso de Amor, isso é uma meta de desenvolvimento, para que alcancemos a que somos destinados a ser: Espíritos da Liberdade e do Amor, e faremos parte da 10ª Hierarquia Celeste.
Por fim, o Apóstolo Paulo deixou em sua Primeira Carta aos Coríntios, no capítulo 13, uma verdadeira oração para dizer o que é esse Amor que fluiu a partir do Cristo e finaliza com o seguinte verso: “Portanto, agora existem estas três coisas: a fé, a esperança e o amor. Porém, a maior delas é o Amor.”
Para ilustrar o tema, um verso:
SERENIDADE
Estar firme
Quando tudo mais balança
Ser bom, ser puro
Como a pureza da criança.
Nos novos tempos
De tantas crises e inseguranças,
Manter a imagem do homem
Viva, limpa, imaculada,
Semelhante ao Pai Criador.
Lutemos com o impulso do Amor,
O mundo está precisando de nós.
Jovina Rulli Bovino


Rita Paula Wey Nunes da Costa

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Eu sou amor


Eu. Eu sou. Eu sou eu. Eu sou o resultado sagrado de uma boa, bela e verdadeira escultura Divina. Eu sou intocado nesta sacralidade. Eu sou a individualidade que trago no coração os liames Divinos. Eu sou aquele que precisa aprender caminho afora que o haurir o Divino do coração é tarefa árdua, que exige passos fundos, calor inquietante, determinação inquebrantável. Eu sou o ser que vinculado ao todo percorre os caminhos do cosmos mobilizado pelo dever de ser finalmente LIVRE. Eu sou a liberdade de escolher o caminho da liberdade. Eu aprendo que preciso prosseguir para o infinito. Eu compreendo que todos são livres neste caminho do libertar-se a cada momento. Eu me liberto dos medos e ilusões a cada passo que dou vinculado na consciência de mim mesmo com todas as conexões que inexoravelmente trago de tantos e tantos caminhos percorridos. Eu sou a força do mar, a fúria do vento, a brandura do pássaro voando no ar, a insinuante presença do peixe nas profundezas das águas do oceano, o calor que brilha no sol, o olhar do felino que define seu alvo para sobreviver, a sorrateira presença do réptil que se desliza junto à sua leveza firme, a respiração que a longos haustos inspira e expira o dentro e o fora, a magia da terra que desabrocha a partir de si toda a semente que sempre se renova, as raízes que no subterrâneo se entrelaçam para se fixarem melhor e fortemente, escolhas que me direcionam caminhos adentro rumo ao necessário aprendizado que é requerido para a evolução, para a transformação do chumbo em ouro.
Eu sou a capacidade de assumir sair do velho, do pretensamente acomodado, e que adentrando-me no novo, resgato o quê de repouso tornar-se -á movimento e que de estagnado transformar-se-á no renovar-se de mim mesmo e do outro.
Eu sou único nesta inteireza ímpar e perfeita porque eu sou originário da Fonte Divina. Eu sou único dentro do multiplicar-se dos outros que se somam à minha presença, enquanto que eu me expando aos outros nos quais também eu sou.
Eu sou o conhecimento do pleno que vive em mim. Eu sou a sabedoria que a mim é direcionada perene e eternamente. Eu sou luz que de tão intensa perdura e emana-se adiante sempre.
Eu sou o crescimento do impulso do integrar-se. Eu sou união. Eu acredito na força do ser na ausculta do silêncio que habita a inquietude.
Eu sou a música das esferas que ressoa vibrante por entre todos os entes dos universos transportando toda a vida que Eu Sou.
Eu Sou Amor.


Ana Maria Silva
Médica - CRMSP 60182

whats 011 998540960

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

O esconderijo do amor


Escrever sobre o amor em tempos de cólera é uma tarefa que o adjetivo simples não pode ser usado para descrever. Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Tom Jobim jamais teriam imaginado que o tema de seus poemas, livros e letras seria tão sufocado em tempos modernos.

Sentada no deck do Centro Paulus, cercada pelo resistente verde da Mata Atlântica, no extremo sul da cidade de São Paulo, o vento sopra e uma leve chuva amarela cai sobre mim. São as flores da sibipiruna que chamam a minha atenção, desviando o meu pensamento do assunto que me permeia neste momento: criar um texto.

Diante de tanta aridez no uso das palavras escritas ou faladas, comecei a procurar onde teria se escondido essa palavra formada apenas com quatro letras, profunda e genuína em seu significado e expressão, mas tão maltratada nos últimos tempos.

Comecei fazendo uma pequena retrospectiva biográfica, passeando pelos meus setênios, relembrando encontros e vivências. Quando foi que reconheci este sentimento em mim pela primeira vez? Diversos momentos foram relembrados. O calor da casa paterna, a primeira professora, as paixonites de adolescência, as companheiras de quatro patas, as amizades que conquistei, os livros que me fizeram sonhar. Todas essas lembranças aqueceram o meu coração, reconheci o amor em cada uma delas, mas duas lembranças me fizeram sorrir de uma maneira especial e aqueceram a minha alma. Os nascimentos de meus filhos, Camilla e Tiago, foram para mim os marcos mais importantes em relação ao amor. Porém, é óbvio demais escrever sobre o amor materno, pensei, nem todas as pessoas se identificam com esse tipo de amor por terem escolhas de vida diferentes, é melhor ampliar meu campo de pesquisa e buscar algo mais universal, disse a mim mesma.
 Abri o computador, digitei as quatro letras e milhares de opções surgiram à minha frente. Para ser mais exata, foram 1.030.000.000 de opções. Surpreendente, mas qual a qualidade desses resultados?

 As primeiras opções estavam relacionadas à casos amorosos de famosos do momento. Nosso querido Vinícius de Moraes já havia dito que seja eterno enquanto dure, mas preferi deixar esses amores fugazes de lado e busquei mais emoção e durabilidade.  É fácil perder a cabeça e o foco na busca pelo amor na profusão de páginas que se apresentam sobre o assunto. Letras de música, títulos de filmes, igrejas, ofertas de produtos, palavras de ordem (mais amor por favor), trabalhos de mestrado, páginas de encontros virtuais, etc. Em cada uma das páginas visitadas lê-se a palavra, mas é difícil reconhecer o sentimento. Ele não está lá. Resolvi dar um passeio pelas músicas. É fogo que arde sem se ver, que mexe com minha cabeça e me deixa assim e que, quando falta, é avião sem asa, fogueira sem brasa, futebol sem bola ou Piu-Piu sem Frajola. Cada melodia uma emoção, cada poesia uma forma delicada de expressar com palavras aquilo que se sente no coração. 


Continuei pesquisando e senti um frio. Comecei a ter a sensação de que o sentimento estava desgastado. Eu estava buscando lógica para escrever sobre um sentimento? Algumas páginas apresentaram o amor como moeda de troca e alguns estudos buscam comprovar que este sentimento é uma construção social ao longo da história a serviço das posses, do poder, do controle, etc. Seco demais, pensei, nem tudo tem que ser selado, registrado, carimbado, avaliado, rotulado como cantava Raul Seixas.
Parei de pesquisar e comecei a observar.

Eliana acaba de se tornar avó. Com um sorriso que aquece os que estão ao seu redor, exibe numa tela de celular, as bochechas rosadas de seu neto. Vanessa, imersa num curso de autoconhecimento, envia uma mensagem de apoio ao seu filho que irá participar de uma competição de judô. Um grupo de pessoas se organiza pela internet para um mutirão de limpeza do recém plantado largo das Araucárias, nas proximidades do Largo da Batata. Tiago atravessa a cidade por duas horas para abraçar e beijar sua namorada. Camilla está em uma foto envolvida pelo terno olhar de Raphael. Luciana sai de seu apartamento e oferece um prato de comida para o senhor que dorme na rua em frente ao seu prédio. Deborah trança os cabelos de seu amigo e decora com uma pequena flor. Um grupo de formação em Aconselhamento Biográfico é acometido por uma virose e o cuidado de cada um, consigo e com os demais, cria um ambiente de pura expressão amorosa. O amor é múltiplo na forma de expressão, pode ser, solidariedade, companheirismo, vínculo, afeto, compaixão ou um simples abraço.

Alguém em algum lugar recebe uma chuva de flores amarelas e reconhece que, mesmo em tempos de cólera, o amor não se esconde, está em todos os lugares, vivo, pulsante e pode ser sentido em cada pequeno gesto de atenção, carinho e zelo que nos rondam a todo o instante.

Sylvia Beatrix Pereira
Aconselhadora Biográfica


quinta-feira, 8 de novembro de 2018

A gênese do amor

Falar sobre o amor não é tarefa fácil, até porque é um sentimento que efetivamente não sei se já nasceu dentro de mim. O que é o amor? Como buscar um significado para esta palavra em princípio tão abstrata. Para tentar chegar à gênese do amor fui buscar amparo nos poetas, nos filósofos, nas religiões, sociólogos sem deixar de me lembrar das pessoas de natureza humilde, distantes da academia, que encontrei ao longo da minha vida e que me comoveram com a profundidade de seus conceitos. Nesse contexto posso me arriscar a dizer que para mim, o amor é um sentimento que, mesmo sem saber definir, sei o que é. Mas como explicar isso? “O amor não se define, o amor se vive”, dizem alguns. Sim, pode ser. Mas como vivo algo que não sei o que é? E me pergunto de onde ele vem? Onde ele nasce se vive em nós? Como podemos ter a percepção do que é o amor se tantas são as definições? Ou se vivemos esse sentimento, como não conseguimos defini-lo com precisão? Por que em cada época da humanidade o “amor” pode ser conceituado de forma que atenda às percepções daquela sociedade, se é algo que está intrinsecamente em nós?

Socorrendo-me do poeta Carlos Drummond de Andrade, aproveitando a data do seu natalício (31/10), trago os versos do poema As Sem-Razões do Amor:” Eu te amo porque te amo. Não precisas ser amante, e nem sempre sabes sê-lo. Eu te amo porque te amo. Amor é estado de graça e com amor não se paga. Amor é dado de graça, é semeado no vento, na cachoeira, no eclipse. Amor foge a dicionários e a regulamentos vários. Eu te amo porque não amo bastante ou de mais a mim. Porque amor não se troca, não se conjuga nem se ama. Porque amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo. Amor é primo da morte, e da morte vencedor, por mais que o matem (e matam) a cada instante de amor.”
Inspirada por esse poema, e especialmente nos versos “o amor é estado de graça ... amor é dado de graça...” fui buscar na Antroposofia, o pensamento de Rudolf Steiner, o que por si só não é um caminho muito tranquilo. Como vem fazendo desde o meu primeiro contato com seus textos, Steiner tem descontruído muitas das minhas crenças sobre os poderes de Deus. Diz Steiner, in O amor e seu Significado no Mundo: “Deus é amor puro, amor sincero e não sabedoria e poder supremos”. Sendo Deus o Amor, este impulso flui para a humanidade pronto, como uma dádiva e nós, seres humanos, podemos capturar esse impulso de forma gradativa. Assim, amor é o fundamento de tudo o que vive, por essa razão sinto que o Amor é, ainda que não consiga traduzir em palavras o seu real significado. Amor é, portanto, esse impulso que se encontra à disposição do ser humano para ser experimentado, vivenciado quando este desejar caminhar as trilhas do aperfeiçoamento espiritual.

Um outro aspecto do amor, na visão do pai da Antroposofia que reverberou fortemente em mim é que o amor “não desperta esperanças para o futuro, e sim liquida as dívidas do passado”, e só quem compreende o amor dessa maneira é um cristão, ou seja, compreende o que significou o Mistério do Gólgota, que é um assunto dos deuses, que estes nos permitiram assistir. Nossa, a partir daqui meu mundo se colocou de cabeça para baixo! E prossegue Steiner: “Este é o único ato terreno totalmente suprassensível; portanto, não se deve estranhar se os que não creem no suprassensível não creem de forma alguma no ato do Cristo”. Foi nesse momento, quando se abre esse portal, permitindo ao homem assistir a um ato divino que chegou o amor ao mundo, através desse impulso crístico. A Antroposofia traz para o conhecimento humano a jornada do homem em sua chegada na Terra, isto é, como ser espiritual, foi adensando sua forma física, até que em determinado momento os deuses que participavam dessa jornada, num encontro com Lúcifer, entregaram a este a sua onipotência. Esse ato possibilitaria ao homem ser livre. Nesse encontro, nesse momento o homem entra na matéria mais que estava programado, distanciando-se dos deuses que estavam em ascensão. Por esta razão, num conselho de deuses, Cristo se disponibiliza a recuperar os homens. Resumidamente este, para quem acredita minimamente no suprassensível, no metafísico, é o maior ato de Amor. E por esta razão, no meu humilde entender, podemos de todas as formas tentar buscar o significado da palavra amor, e só conseguiremos tangenciá-lo se percebermos que “surge o amor por algo que está dentro de nós mesmos”.

Finalizando, obviamente com Drummond, deixo novas perguntas:
   “Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? sempre, e até de olhos vidrados, amar?   Que pode, pergunto, o ser amoroso, sozinho, em rotação universal, senão rodar também, e amar? amar o que o mar traz à praia, o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?   Amar solenemente as palmas do deserto, o que é entrega ou adoração expectante, e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina. Este o nosso destino: amor sem conta, distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas, doação ilimitada a uma completa ingratidão, e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor. Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.” (Amar)

Tereza Racy
É jornalista, mãe de ex aluna waldorf  e membro do Conselho deliberativo da Escola Waldorf Francisco de Assis 

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Possibilidades...e Identidade(s)


Bem vindo (a)! Nascer para a vida, uma abertura de sentidos, ruídos, emoções e imagens entre muitos e muitos registros. Os gestos são espontâneos, alta expectativa do entorno, nada será como antes, turbilhão de informações e sentimentos que envolvem o chegar no mundo.
Por volta dos 03 anos, a percepção do EU, uma fase de Egocentrismo e da mobilidade do Corpo Físico, alguns passos e logo chega as outras relações na Escola, novas conexões a troca de informações e mais uma etapa se faz em direção ao 3º setênio, um outro nascimento que se faz com grande intensidade de valores, uma vez que se apresenta à Identidade, recheada de opiniões, críticas, rejeições e afinidades para contextualizar ou transformar o Mundo e as relações.
Nesta fase, ocorrem várias alterações físicas, na voz, nos membros, nos hormônios tão subitamente, assim como instabilidades internas, provocando uma revolução/ ebulição onde o jovem ancora seu processo de individuação, de forma contraditória, uma vez que os instintos, ideais, interesses e sentimentos vem à tona caracterizados através de imagens, aspirações para agir na vida prática e se apresentam em forma de crise ou de aspiração social/ideais.
A meta não é clara, no entanto, através do confronto com a auto realização do “Self” (de si mesmo), ocorre um desabrochar de intenções que  leva o jovem para  a realização de um centramento e escolhas em direção ao caminho de individuação colocando suas intenções, ousadias e pegadas em cada ação.
Desta forma, as possibilidades e contradições surgem, e os passos são dados em direção ao labirinto de desafios e encontros...percorrendo mais um ciclo e aprendendo a se desenvolver dia após dia, indo para o Mundo e voltando para si.

Amadurecer significa decidir-me entre
Aguentar e fugir,
Prender e soltar,
E aprender
Quando o quê é adequado.
Só assim
Não irei me desgastar
Nem exigir menos de mim.
Assim permaneço desperto
Entre contração e distenção
Ulrich Schaffer – Poemas Meditativos – Crescer e Amadurecer

Alessandra Castro de Paula

Psicóloga, arteterapeuta e facilitadora de Constelações Sistêmicas

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

A celebração de uma etapa de vida


Terceiro setênio – celebremos essa linda fase! 

Como não celebrar quando falamos de uma fase tão importante da biografia humana?
Dar as boas vindas ao terceiro setênio é possibilitar ao jovem abrir as portas para um novo mundo, despedindo-se do universo cósmico chamado infância, para conquistar o seu lugar na sociedade e no mundo.
Essa transição vai exigir coragem, ousadia e determinação para lidar com uma série de crises, conflitos e turbulências. Nessa época, mudanças hormonais e corporais ocorrem; os membros se alongam e, de forma desajustada, se fortificam e se preparam para transformar a terra e o mundo; órgãos digestivos (metabólicos) atuam mais para a elaboração dos alimentos; alteração na voz, nascimento de pelos, espinhas e uma série de outras metamorfoses acompanham o adolescente, que trilha a incansável busca de si.
É tudo muito novo e idealizado. Nessa fase, ele projeta a imagem de quem se transformará. Muitas dúvidas permeiam seu universo e perguntas como “o que eu quero para a minha vida?”, “quem sou eu?”, “o que faço do meu mundo?” são comuns e, uma das dificuldades é discernir o que é dele e o que é herança de pai e mãe. Eis aqui uma importante questão. Nesse contexto, a grande briga interna é deixar para trás aquilo que o ajudou chegar até ali e, à partir disso, caminhar na conquista do seu Eu.
Essa equação é desafiadora para ele que, muitas vezes, tem a sensação de estar caminhando “na contramão”. Mergulhado em sentimentos conflitantes, relaciona-se ora lançando críticas contra tudo e contra todos, ora ensimesmado em profunda solidão, fechando-se em seu mundo. Para a família, também, nem sempre é uma tarefa simples. Na tentativa de ajudar, muitas vezes, é pouco compreendida e, nessas horas, o risco é o distanciamento, as discussões e os desentendimentos. O mais importante nesses momentos é que esse jovem seja acolhido com carinho, respeito e presença afetiva, envolvido por diálogos construtivos, sem cobranças ou julgamento. Esses nutrientes alimentarão a alma do “entusiasmado buscador”.
É experimentando que esse jovem desabrocha e, qualquer sentimento de solidão, dura pouco. Ele precisa interagir para ter referência do mundo, ajudando-o a imprimir sua marca e seu jeito de ser. Com frequência, buscará nos grupos em que é aceito, o reforço e o apoio para suas ideias e convicções que ainda não sente coragem e fortalecido para enfrentar sozinho. Desta forma, vai conquistando sua independência.
A educação para esse peregrino, diferentemente do primeiro setênio que acontece pela imitação e, do segundo setênio, pela autoridade amada, nessa fase é pela “liberdade” interna e externa. Ele necessita experimentar, expor suas opiniões, conquistar autonomia, até encontrar o fio da meada vinculado ao seu destino. É por volta dos dezoito anos e meio, aproximadamente, com o fenômeno chamado “nó lunar”, quando sol e lua se encontram na mesma posição em que estavam no momento do nascimento, permitindo maior abertura para recordar a sua “missão de vida”, que o trouxe para a terra. Nessa fase, muitas vezes, decide-se o vestibular para determinada área e começa a sonhar com a atuação profissional.
Vale destacar que ele busca o que é verdadeiro e autêntico nos adultos e nas relações à sua volta. Essa verdade servirá de alicerce para a nova fase que adentrará mais tarde, além de contribuir para que se transforme em um adulto íntegro e fiel aos valores aprendidos e conquistados. Aos poucos, vai amadurecendo internamente para despedir-se do passado da adolescência e ingressar na vida adulta com maestria.
Como não se encantar com esse momento tão importante na vida dos jovens? É fundamental compreendermos a tônica dessa fase para que possamos como pais, educadores e influenciadores dessa juventude, fomentar o lado saudável na jornada desse adolescente, almejando por encontrar a sua verdadeira essência.

Daniela Curioni
Psicóloga Clínica




quarta-feira, 17 de outubro de 2018

TERCEIRO SETÊNIO E AS BASES PARA O FUTURO


Em uma aula de 10º ano, uma aluna, após uma exposição e debate sobre a epopeia Gilgamesh, pergunta se era verdadeiro o que a obra dizia. Os versos falavam sobre um dilúvio. Sobre um homem escolhido pelos deuses para construir um imenso barco e colocar em seu interior um casal de cada espécie animal da terra. Sobre o tempo que o barco ficou boiando sobre as águas. Sobre a salvação da espécie humana após aportar novamente em terra firme. A pergunta da aluna possuía também um segundo propósito: ela conhecia bem a história bíblica de Noé, e por isso, ao receber a informação de que a epopeia suméria fora escrita antes do relato bíblico, algo dentro de si se moveu e seu pensamento passou a elaborar a dúvida que ela então verbalizou na aula. Esse pequeno relato talvez nos mostre de uma maneira mais límpida o que vem a ser um jovem em seu terceiro setênio.

O que há nisso de tão sintomático? O que nos é revelado aqui? Pensemos que a exposição do professor estabeleceu como foco a grande aventura do herói Gilgamesh em busca da imortalidade. Ele perdera seu grande amigo Enkidu e tomado de tristeza e angústia pelo sentimento de morte, descobre que apenas um homem na Terra conquistara o dom de ser imortal. Parte em busca dele. É o que o professor narra aos alunos, que o acompanham nessa jornada. E ele encontra este homem, que se chama Utnapishitin. E esse homem conta sua história, de como recebera a imortalidade. E aí sabemos da história do dilúvio. O professor faz uma pausa. Todos olham e pensam. Talvez já tenham ouvido essa história. Então questionam o professor: mas não é a história de...? Elas se parecem, não há dúvida. E qual é a mais antiga? A revelação causa outro silêncio. O professor nada diz. Espera. E aí vem outra pergunta. Há outros relatos semelhantes? Sim, há. Em diversas culturas. Inclusive a ciência fala de uma grande inundação em tempos bastante remotos. Outro silêncio. E aí vem a pergunta: mas qual desses relatos é o verdadeiro?

Entremos nesse jovem e vejamos o que possa estar acontecendo. Ele acompanhava a narrativa que tratava de uma literatura de um povo arcaico, os sumérios. Ao mesmo tempo que recebia informações sobre essa cultura, seu modo de existir e de pensar, seus rituais e costumes, também acompanhava a vida do herói Gilgamesh, um rei severo e arrogante, injusto com seu povo, que tem o seu poder colocado à prova pelos deuses. O rei que se achava poderoso é derrotado em uma luta por uma criatura enviada pelos deuses, Enkidu, que havia sido criado na floresta, entre os animais selvagens. Diante da derrota, Gilgamesh conhece o que antes jamais praticara, a misericórdia e a compaixão. Essas virtudes, praticadas por Enkidu, libertam o rei do que o aprisionava: seus próprios sentimentos. Tornam-se amigos e irmãos. Essas imagens atravessam o sentir do jovem que as ouve e são redimensionadas em seu pensamento. Lá se juntam com as informações que tem sobre os sumérios, sobre a literatura arcaica, sobre as religiões antigas. O que move o herói?

Um dos principais aspectos que se relacionam ao conhecimento do terceiro setênio é quando abordamos a questão do nascimento do corpo astral e da formação do juízo. O que, em termos mais claros, eles podem significar? Temos aqui uma espécie de equação que não pode ser perdida de vista. O pensar do jovem se desenvolve de forma extraordinária nessa fase da vida. A capacidade de abstração se intensifica e ele pode agora transformar fatos em conceitos, relacionar diferentes âmbitos da realidade em uma síntese conclusiva. Essa capacidade, dentro de um desenvolvimento normal, permite que a aprendizagem possa seguir caminhos cada vez mais complexos. No entanto, ao mesmo tempo que ela é maravilhosa, possui também sérios riscos. Entusiasmado com sua habilidade de pensamento, o jovem pode se tornar soberbo, arrogante. Ele agora sabe tudo. Principalmente mais que os adultos. Sua habilidade dialética se torna nociva, porque não consegue abarcar a empatia, que é a capacidade de compreender o pensamento do outro. Por outro lado, o pensar pode se tornar frio, excessivamente racional, por uma ausência de reflexão permeada de sentimentos. Os dois aspectos percebemos fortemente nos tempos atuais.

Ao retomarmos a aula do primeiro parágrafo podemos observar que o pensamento da aluna se manifestou em virtude de alguns aspectos importantes: informação dada dentro de uma sequência em que os elementos façam sentido; possibilidade de exercer empatia ao perceber o espaço proporcionado para as reflexões sobre a personagem e suas ações; prática da pergunta que advém de um real desejo de compreender a oferta do mundo. A esses três aspectos, um quarto deve ser acrescentado, talvez o mais importante: o pensamento elaborado é construção do próprio aluno. O professor pavimenta o caminho da reflexão, mas não dá o destino. Esse destino quem estabelece é o aluno, porque é nesse plano que seu corpo astral tem a oportunidade de encontro com seu eu futuro. Aqui forma-se o caráter num sentido muito mais amplo que o de comportar-se socialmente. Pelo pensar livre, porém permeado de empatia, o aluno permite-se criar para si as questões que fundarão seu caminho de vida. O terceiro setênio é a construção do porto que leva ao futuro.

Sidnei Xavier dos Santos

Professor de Literatura da Escola Waldorf Francisco de Assis

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Criatura criada criando: fenômeno do terceiro setênio




Alguém já disse: Ah... essa idade é fogo!  E isso, pode ser aplicado à varias idades, não é mesmo?! O fato é que todas as idades tem suas dificuldades e suas recompensas. Em cada fase encontramos material para criar 'a dor e a delícia de ser' quem somos, como diria Caetano.

Nossa vida é um ato criativo constante. Somos criados, nos criamos. E para isso, é possível encontrar em cada fase, presentes que nos são conferidos, seja pela hereditariedade, seja pelo plano celestial.
Cada uma dessas recompensas  podem ser reconhecidas como as ferramentas necessárias que recebemos para criarmos a nossa obra na Terra.
Lá no primeiro setênio de vida, podemos encontrá-las  nas características dos tipos constitucionais, assim como no segundo setênio nos temperamentos, e no terceiro setênio, através das qualidades planetárias.
Todos esses presentes, que trazemos da nossa biografia noturna, vão moldando a maneira como captamos o mundo e como atuamos sobre ele, nos  orientando para a missão a ser realizada. 
Tomando a linha de desenvolvimento como ponto de partida, ao final do terceiro setenio concluímos uma etapa que servirá de apoio para as vivências futuras, e a partir desta fase, ganhamos a autonomia para realizar nosso propósito. Até este momento, estamos receptivamente recolhendo material a ser lapidado e, também, resignificado, ao longo dos outros anos.
Até o final do terceiro setenio, os pais, e outros adultos, são os responsáveis pela orientação do desenvolvimento, mesmo que neste setenio a vida se torne assunto próprio, e tudo o que existe seja questionado formando uma grande interrogação sobre 'o que farei' e 'quem sou'. Esses são os passos  para a experimentação da autonomia responsável.  Ainda assim, embora cada vez mais distantes, aos pais cabe apoiar esse desenvolvimento através de orientações, diálogos, muitos diálogos até o final desse terceiro setênio.
Nem sempre dialogar é tarefa fácil e raramente é simples entre os 14 e 21 anos. Este é o período em que o pensar é ativado como nunca, e o jovem está em busca da verdade. Da sua própria verdade e da verdade de todos ao seu redor. E isso o torna muito crítico e exige muita coerência. Porém, como além do sentido do pensamento e da linguagem, nesta época, a audição ganha especial atenção no desenvolvimento, e convém, como responsáveis pela orientação do desenvolvimento de seres nessa etapa, levá-los a compreender a importância do ouvir e considerar a verdade do outro com respeito e tolerância.
Esses fundamentos são de grande importância para as etapas futuras, e primorosas nos tempos atuais, mas sempre relevantes também porque o impulso para a transformação é própria dessa fase. Há energia, idealismo, interesse por um mundo melhor, mesmo que muitas vezes isso não venha acompanhado de valores que garantam sua integridade. Os valores que foram encontrados no segundo setenio e a noção de integridade no primeiro setenio, para ressaltar como uma coisa está atrelada a outra.
Se o conhecimento pode nos apoiar para conduzir o desenvolvimento de jovens isso também está disponível para eles conduzirem uma nova etapa de suas próprias vidas, e um dos grandes desafios que se apresentam é adentrar nos conhecimentos pelos quais eles se interessam sem que o nosso saber sufoque seus interesses ou, no oposto, os despreze como indíviduos.
E  em paralelo com toda ânsia de obter a verdade sobre as coisas, há o amor. Um impulso extraordinário que os leva a buscar o sentido das coisas e se aproximar de pessoas, principalmente em grupos de convivência. Mas o amor extrapola essa vivência e clama por uma experiência divina, idealizada, que invariavelmente se confronta com seus instintos. E se por um lado seus encontros afetivos possam leva-los a experiências tão divinas quanto infernais, por outro, a mística pode se converter em propósito.
Mesmo numa era digital, onde os encontros reais são escassos, ainda assim, surge uma personalidade inspiradora nesta fase da vida que leva, consciente ou inconscientemente, para futuras escolhas.
Saibamos dialogar e explorar o universo desses jovens, sem no entanto querer estreitá-lo. Já que à eles cabe o impulso para a transformação de um novo mundo. Mesmo que seja apenas o de tornar vazio o ninho em que viviam.

Olivia Gonzalez
Mãe waldorf do maternal ao 12º ano

Terapeuta corporal, floral e aconselhadora biográfica

Tema de Reflexão do Mês

Escolhemos um tema como base de reflexão que será iluminado por profissionais de diversas áreas segundo seu olhar e suas vivências. Colaborações e comentários são bem vindos!

Iniciativas Antroposóficas na ZN

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