
Muitos contestarão dizendo que no passado era assim, mas
agora vivemos mais e não estamos velhos nessa etapa da vida. Não, não estamos
velhos, mas nos deparamos com o envelhecimento. E envelhecer, pelo menos para
mim, é uma dádiva! Muitos não chegam a realizar esta etapa, ou porque faleceram
antes ou porque se recusam a amadurecer no seu próprio tempo.
E quantos paradigmas criamos sobre o termo ‘envelhecer’
de maneira pejorativa ? Por que é preciso lutar contra o envelhecimento? Me
parece, quase, como impedir o curso do rio.
Numa época em que a juventude é tão glamourosa e se
anseia em se manter nela, como lidamos com as mudanças? E se evitamos
essa etapa, como nos preparamos para ela?
Tem sido comum ouvir “não quero envelhecer como meus
pais” e, buscando reconhecer o que não se quer, ouço sobre o afastamento
dos amigos, da vida cultural, dos familiares, e a dificuldade em transitar pela
cidade, seja pelo medo da violência ou pela restrição de movimentos.
Quando tudo isso vai ficando mais
próximo da própria realidade, é possível se deparar com a necessidade de
cuidar da vida de uma maneira diferente.
Diferente no quê? Diferente no
propósito, na essência.
Esse tempo entre os 56 e 63 anos não é
lá aquele período onde a quantidade se sobressai, mas a qualidade. Por isso,
não é tanto quanto fazemos, mas como e para quê fazemos. A vida vai ficando
mais preciosa e as vivências e aprendizados assumem maior importância, não no
sentido de ter razão ou se impor, mas de compartilhamento e semeadura.
Chegar ao 9º setênio é como alcançar o topo de um morro.
E dependendo de como vivemos até aqui, podemos chegar bastante cansados no topo
desse morro!
Então em um dos passos dessa caminhada, ao
considerar a saúde física, cada vez mais delicada, podemos ponderar: Como
a vitalidade foi cuidada ?
Mas o cansaço nem sempre é físico e a falta de ânimo que
essa fase pode trazer por tudo o que já foi citado: afastamento das relações,
empobrecimento da vida cultural, restrições da mobilidade - pode se
caracterizar numa depressão. E noutro passo, vale refletir: Como os sentimentos
foram elaborados ?
“Hipocondria não é apenas uma característica do ser humano
que envelhece; ela surge exatamente porque ele não consegue envelhecer de forma
sadia.” Rudolf Treichler.
Do alto desse morro, ao olhar para o percurso que
percorremos também somos levados a checar o propósito da nossa existência, a
reconsiderar quais foram as sementes que espalhamos, o que nos impulsionou
nesse caminho, e os frutos que produzimos.
As leis biográficas que alcançam até os 63 anos não
determinam o fim da existência. E significam que a partir dessa idade há uma
mudança ainda mais significativa no propósito da vida. Vc atravessa um novo
portal, assim como aos 21 anos vc se depara com sua autonomia e ganha o mundo,
e aos 42 anos ganha uma consciência mais clara sobre si e o mundo. Mas não é
uma chave virada, é um virar a chave. É processo. Não acontece da noite para o
dia.
Enquanto transitamos pelo 9º setênio, podemos repassar
nossas lições - para nós e para os outros - até porque aprendemos melhor quando
ensinamos e podemos resgatar o que nos sustentou, e o que se revela
essencial.
Se ‘o que a gente leva da vida é a vida que a gente
leva’, chegamos naquela fase em que é preciso considerar nossa bagagem com essa
qualidade. E a partir do que é valioso, daquilo que vivemos e aprendemos,
revigorar a semente adquirindo novas habilidades para criar uma história
desatada do passado, nos habilitando para criar uma nova missão com a sabedoria
depurada. Esta época abre a oportunidade para nos conectarmos com o que é
essencial para nós, para nos conectarmos com nossas sementes, como os
potenciais que foram usados e aqueles que precisaram esperar um nova
oportunidade (talvez como esta agora) para vicejar ou aquelas que foram
abafadas, suprimidas e nem se sabe ainda se sobreviverão, ou o esforço que nos
exigirão.
Chegamos ao topo do morro. E o que se vê dali?
A vida em vc mesma, introspectivamente.
Fechamos os olhos e revemos a vida em si mesmo. E
fechar os olhos assim é um desafio, porque sabemos que não encontraremos só
vitórias, prazeres e alegrias. Mas, apesar disso, podemos nos deparar com
aprendizados muito valiosos que nos sustentarão para usufruir a liberdade de um
novo ciclo desamarrado do passado, sem no entanto, negá-lo.
Neste período entre 56 e 63 anos, temos a oportunidade de
reconsiderar nossas metas de vida e refletir mais profundamente sobre nossa
missão e lançar a pergunta: O que ainda está por realizar?
Neste momento de se preparar para os próximos setênios,
também podemos nos retirar da posição de rei e rainha e deixar os outros
assumirem esse papel, nos colocando em segundo plano para quando formos
requisitado. Esse recolhimento abre espaço para que o novo na vida venha a
surgir e que a sabedoria conquistada com a experiência possa ser depurada, para
que seu extrato possa servir aos outros.
Essa época traz, enquanto imagem, o final do outono e o
surgimento do inverno, quando as forças exteriores começam a minguar e
deixam de ser evidentes porque há uma concentração no interior, e essa
concentração é que permitirá uma primavera ainda mais potente.
E se este momento propicia começar a se preparar para dar
o que recebeu,
quais são as sementes que quer ver florescer no
novo ciclo ?
Olivia Gonzalez
Aconselhadora biográfica, terapeuta corporal e floral
Bibliografia:
Biografia e psique, Rudolf Treicher
Biografia e doença, Angélica A. Justo e Gudrun K.
Burkhard