
Dando
asas à imaginação, visualizando nosso planeta como uma gigantesca colmeia ou um
belo formigueiro; às vezes sinto que fomos atingidos de maneira brutal por um
objeto resistente que partiu, destruiu este sistema da forma como até agora
estivera organizado. Somos abelhas e formigas desorientadas, uma nuvem de
pessoas sem direção.
No
entanto, diferente do comportamento dessas trabalhadoras da natureza que, a
partir do seu instinto sabem se reorganizar e o que cada uma deve fazer para
ter a sua colmeia ou formigueiro reconstruído, não serão os nossos instintos –
exacerbados e intolerantes neste momento - que contribuirão para a
reorganização da nossa vida em sociedade. Outro ponto importante nessa
analogia: abelhas não poderiam colaborar na reconstrução do formigueiro e nem
as formigas poderiam ser solidárias e ajudar as abelhas com suas atividades em
prol da colmeia. Se não nos valem os instintos do reino animal, temos na
instância humana o recurso necessário. A consciência.
Vivenciar
a “alma da consciência” nesta quinta época cultural, etapa do processo de evolução
humana na qual nos encontramos - segundo Rudolf Steiner - tem cobrado seu preço
e a polarização tem sido uma das moedas utilizadas para efetuarmos esse
pagamento.
O
caminho para “uma relação livre e individualmente moral consigo mesmo e com o
mundo” – nas palavras de Sergei O. Prokofieff, em O significado oculto do
Perdão (Ed. Antroposófica) – passa pela compreensão e prática da “entrega
total”.
Do
latim PER (total) DONARE (entregar, doar), o perdão traz em sua significativa raiz
uma ação. E, como toda ação gera uma consequência, a que tipo de ciclo estamos
nos referindo? Oferecer a resposta pode ser um caminho que nos leve a outra
situação comum da atualidade: a polarização. Eu escrevo a partir de uma ideia,
quem lê interpreta a partir de sua compreensão pessoal. Impasse criado. E, por
mais que eu aprofunde meus conhecimentos nestes estudos, quem disse que eu
tenho a resposta?
Em
muitos dos ambientes que frequentamos e a maioria dos temas que abordamos têm
sido permeados pela dualidade. Árimã e Lúcifer já estão sentados na sala de
visitas e os Asuras estão a caminho.
O
legado que Rudolf Steiner deixou à Humanidade, em especial aos que sentiram-se
chamados a aprofundar suas vivências e conhecimentos tendo como base a
Antroposofia, não escapou dessa polarização. Acredito que não seja coincidência
este texto estar sendo redigido quase oito meses depois de minha primeira
leitura do livro de Prokofieff. Certo e errado, bem e mal, esquerda e direita
têm sido o cerne de discussões dentro da Sociedade Antroposófica e fora dela. Revendo
anotações, impressões e refletindo sobre o que gostaria de escrever, fixo-me de
forma mais atenta ao prefácio do autor e aos dois anexos que ele contém: a
carta-apelo de Marie Steiner à reconciliação e a carta-resposta de Ita Wegman.
A
ideia inicial de fazer uma resenha sobre o livro perdeu-se entre a releitura do
prefácio e das cartas já mencionadas. O texto profundo do autor traz
desconforto por relembrar a responsabilidade que está em nossas mãos: unir,
colaborar e perdoar para construir. Atitudes e ações que as abelhas e formigas
não podem fazer umas pelas outras e, nem por nós.
Marie
Steiner inicia sua carta mencionando os problemas que a Sociedade Antroposófica
enfrentava nos idos de 1942 e pergunta: “o que podemos fazer para resgatar
nossa substância moral?” Ita Wegman em sua resposta diz o quanto ficou
impressionada com as palavras de Marie, pois “são importantes e cheias de
possibilidades para o futuro.” Palavras que ainda ecoam em nossos dias.
Nas
primeiras páginas, Prokofieff aponta a direção que precisamos seguir na busca
de elementos para construir as respostas pelas quais ansiamos. Baseando-se na
relação que um discípulo muito próximo a Steiner, Friedrich Rittelmeyer, fez
entre a oração que o Cristo nos ensinou e as sete épocas culturais pós-atlante
da evolução humana, as palavras que poderão nos servir como guia são: “E
perdoa-nos de nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.”
É no olhar, na escuta, na compreensão, no
amparo a esse “outro eu”, tão diverso e ao mesmo tempo tão igual, que
reconstruiremos essa nossa grande colmeia – ou formigueiro! - preparando a
todos para os desafios das próximas épocas culturais. Seremos coerentes com a
máxima, não eu, mas o Cristo em mim nos diversos âmbitos das relações humanas.
Ler
ou reler O significado oculto do perdão pode ser um passo nessa direção.
O mundo espiritual também agradece.
Sylvia Beatrix Pereira
Aconselhadora biográfica
Nenhum comentário:
Postar um comentário