quarta-feira, 19 de junho de 2019

Per Donare


“A situação crítica atual…” Essa frase, pronunciada e escrita à exaustão em nosso cotidiano, precisa ser substituída.
Dando asas à imaginação, visualizando nosso planeta como uma gigantesca colmeia ou um belo formigueiro; às vezes sinto que fomos atingidos de maneira brutal por um objeto resistente que partiu, destruiu este sistema da forma como até agora estivera organizado. Somos abelhas e formigas desorientadas, uma nuvem de pessoas sem direção.
No entanto, diferente do comportamento dessas trabalhadoras da natureza que, a partir do seu instinto sabem se reorganizar e o que cada uma deve fazer para ter a sua colmeia ou formigueiro reconstruído, não serão os nossos instintos – exacerbados e intolerantes neste momento - que contribuirão para a reorganização da nossa vida em sociedade. Outro ponto importante nessa analogia: abelhas não poderiam colaborar na reconstrução do formigueiro e nem as formigas poderiam ser solidárias e ajudar as abelhas com suas atividades em prol da colmeia. Se não nos valem os instintos do reino animal, temos na instância humana o recurso necessário. A consciência.
Vivenciar a “alma da consciência” nesta quinta época cultural, etapa do processo de evolução humana na qual nos encontramos - segundo Rudolf Steiner - tem cobrado seu preço e a polarização tem sido uma das moedas utilizadas para efetuarmos esse pagamento.
O caminho para “uma relação livre e individualmente moral consigo mesmo e com o mundo” – nas palavras de Sergei O. Prokofieff, em O significado oculto do Perdão (Ed. Antroposófica) – passa pela compreensão e prática da “entrega total”.
Do latim PER (total) DONARE (entregar, doar), o perdão traz em sua significativa raiz uma ação. E, como toda ação gera uma consequência, a que tipo de ciclo estamos nos referindo? Oferecer a resposta pode ser um caminho que nos leve a outra situação comum da atualidade: a polarização. Eu escrevo a partir de uma ideia, quem lê interpreta a partir de sua compreensão pessoal. Impasse criado. E, por mais que eu aprofunde meus conhecimentos nestes estudos, quem disse que eu tenho a resposta?
Em muitos dos ambientes que frequentamos e a maioria dos temas que abordamos têm sido permeados pela dualidade. Árimã e Lúcifer já estão sentados na sala de visitas e os Asuras estão a caminho.
O legado que Rudolf Steiner deixou à Humanidade, em especial aos que sentiram-se chamados a aprofundar suas vivências e conhecimentos tendo como base a Antroposofia, não escapou dessa polarização. Acredito que não seja coincidência este texto estar sendo redigido quase oito meses depois de minha primeira leitura do livro de Prokofieff. Certo e errado, bem e mal, esquerda e direita têm sido o cerne de discussões dentro da Sociedade Antroposófica e fora dela. Revendo anotações, impressões e refletindo sobre o que gostaria de escrever, fixo-me de forma mais atenta ao prefácio do autor e aos dois anexos que ele contém: a carta-apelo de Marie Steiner à reconciliação e a carta-resposta de Ita Wegman.
A ideia inicial de fazer uma resenha sobre o livro perdeu-se entre a releitura do prefácio e das cartas já mencionadas. O texto profundo do autor traz desconforto por relembrar a responsabilidade que está em nossas mãos: unir, colaborar e perdoar para construir. Atitudes e ações que as abelhas e formigas não podem fazer umas pelas outras e, nem por nós.
Marie Steiner inicia sua carta mencionando os problemas que a Sociedade Antroposófica enfrentava nos idos de 1942 e pergunta: “o que podemos fazer para resgatar nossa substância moral?” Ita Wegman em sua resposta diz o quanto ficou impressionada com as palavras de Marie, pois “são importantes e cheias de possibilidades para o futuro.” Palavras que ainda ecoam em nossos dias.
Nas primeiras páginas, Prokofieff aponta a direção que precisamos seguir na busca de elementos para construir as respostas pelas quais ansiamos. Baseando-se na relação que um discípulo muito próximo a Steiner, Friedrich Rittelmeyer, fez entre a oração que o Cristo nos ensinou e as sete épocas culturais pós-atlante da evolução humana, as palavras que poderão nos servir como guia são: “E perdoa-nos de nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.”
 É no olhar, na escuta, na compreensão, no amparo a esse “outro eu”, tão diverso e ao mesmo tempo tão igual, que reconstruiremos essa nossa grande colmeia – ou formigueiro! - preparando a todos para os desafios das próximas épocas culturais. Seremos coerentes com a máxima, não eu, mas o Cristo em mim nos diversos âmbitos das relações humanas.
Ler ou reler O significado oculto do perdão pode ser um passo nessa direção. O mundo espiritual também agradece.

Sylvia Beatrix Pereira

Aconselhadora biográfica


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