sexta-feira, 29 de março de 2019

Alma da Consciência


O setênio que abrange as idades entre 35 e 42 anos é denominado Sexto Setênio e devemos começar a desenvolver em nós a Alma da Consciência.
Ocorre nesta fase um declínio da vitalidade do corpo físico, há uma perda gradual na força física, mas também estamos nos voltando para um caminho anímico – espiritual, podemos sintetizar esta fase assim: trocamos vitalidade no corpo por vitalidade no espírito.
Se mantivermos nesta fase um bom ritmo na vida, com horários bem estabelecidos para dormir, se alimentar, trabalhar e se divertir, podemos diminuir essa perda de força.
Essa situação é proposital, pois o declínio do corpo físico cria condições fisiológicas para a ampliação da consciência, por isso Rudolf Steiner também denomina este setênio como Alma da Consciência.
Muito importante esta fase da vida para o ser humano, pois nela temos que, se todo o desenvolvimento anterior ocorreu adequadamente, começaremos a amadurecer psiquicamente e despertaremos na nossa alma uma atuação mais ética e moral.
Deveremos agir no mundo, não somente pelo que é certo ou errado, mentiroso ou verdadeiro, construtivo ou destrutivo, mas sim,  nossa atuação estará de acordo com o ético e moral. Isto é, nossa atuação irá além, ela terá que estar de acordo com o bem da humanidade.
E principalmente não poderemos falar ou agir em desacordo com o que pensamos, cada vez mais, no tempo em que vivemos, teremos que desenvolver a coerência entre as três atuações da alma humana, o pensar, o sentir e o querer, eticamente e moralmente.
Esse despertar da Alma da Consciência trará também uma necessidade muito grande de autoconhecimento, compreender nossos limites, e ver os nossos  defeitos antes de ver os defeitos nos outros.
Não poderemos deixar de colocar um fato muito importante que ocorre neste setênio, o segundo nodo lunar por volta dos 37 anos. O nodo lunar ocorre quando a Lua volta para a mesma posição na constelação de nascimento, proporcionando uma abertura para a visão da sua meta encarnatória.
A situação acima muitas vezes provocará uma crise, trazendo nesta idade profundas mudanças, separações, troca de profissões ou doenças como depressão, esta última doença ocorre porque quando temos a visão da meta encarnatória  percebemos que estamos fora da meta. Mas o sofrimento, a doença e as crises virão para que pensemos em nossas vidas e assim proporcionando o amadurecimento anímico com o fim de realizarmos nossas   metas.
Assim, crises são sinônimos de desenvolvimento.
Para elucidar melhor temos Dra. Gudrun Burkhard em seu livro – Tomar a vida nas próprias mãos – pág.115; “Justamente aos 37 anos (duas vezes 18 anos e meio) ocorre o segundo nodo lunar. Novamente acontece uma maior abertura, e o ser humano fica mais próximo do Cosmo e de si mesmo. “Minha missão de vida começa a aparecer claramente, e eu quero empenhar os meus próximos anos em realizá-la!”... “R. Steiner aponta para o fato de só a partir dos 35 anos o indivíduo se tornar realmente útil para a sociedade. Até então ele recebeu muito dos outros e do mundo; agora, todo esse aprendizado vai-se transformando e ele se torna capaz de dá-lo.” A partir da lição acima podemos também dizer que a partir deste setênio vamos adentrar nos Mistérios Do Ser.
Portanto, este setênio é muito importante para a nossa vida, que saibamos aproveitar tudo de bom ou ruim que ele nos proporcionará, pois somente quando ultrapassarmos esses desafios poderemos alçar voôs maiores em direção ao desenvolvimento do espírito.
Por fim, para ilustrar o presente trabalho um poema de Hermann Hesse:
Tal qual cada flor fenece
E toda juventude cede à idade
Floresce cada patamar da vida
Toda sabedoria e toda virtude
Também florescem ao seu tempo
E não devem durar eternamente
O coração precisa estar, em cada patamar da vida,
Predisposto à despedida e a novo início
Para, na coragem e sem pesar,

Entregar-se a novas ligações
E em todo começo reside uma magia
Que nos protege e nos ajuda a viver.
Temos de transpor, dispostos , espaço a espaço
E a nenhum nos apegar  como uma pátria
O Espírito Universal não nos quer prender e limitar.
Quer erguer-nos degrau a degrau, quer nos ampliar.
Mal nos habituamos a um ambiente,
Sentindo –o familiar, ameaça  o acomodar-mos.
Só quem esteja pronto a partir e viajar
Talvez escape do hábito paralisante.
Talvez ainda a hora da morte
Nos envie, jovens, a novos espaços;
O apelo da vida a nós jamais há de findar.
Vamos lá, meu coração: despede-te e convalesce.


Rita Paula Wey Nunes da Costa

quinta-feira, 21 de março de 2019

Ter ou Ser


Este é um tema que me acompanha há muito tempo.
Se olharmos pelo olhar da Antroposofia, está no fluxo investirmos no Ter nos nossos primeiros setênios.
Começamos na busca de aquisição de novas habilidades, do fazer. Um bebê já nasce sabendo sugar e vai aprimorando essa habilidade pra conseguir se alimentar através da amamentação, mas ainda não sabe que é um Ser separado de sua mãe e que tem emoções e pensamentos próprios.
Nos dois setênios iniciais (0 a 14 anos) a energia está muito concentrada no nascer físico e emocional.
É no 3º setênio (14 a 21 anos) que começa o nascer da identidade, quando começamos a nos questionar sobre quem somos. Mas esse questionamento e reflexão ainda é muito inicial. O nosso corpo físico ainda grita na adolescência. E será nos setênios seguintes, principalmente a partir dos 30 anos, que essa voz que questiona quem é esse Ser e o que viemos fazer aqui nesse mundo, começa a ganhar mais espaço.
Na nossa cultura ocidental e capitalista a voz do Ter grita mais alto.
Precisamos Ter uma profissão, um bom salário, um apartamento, um carro, um casamento, filhos...uma lista que não tem fim para que alguém possa se considerar “bem sucedido” na vida.
Enquanto isso, a voz do Ser encontra-se silenciada muitas vezes, e perguntas como: Como estou me sentindo? Me sinto integrado nas minhas vivências? Sinto que trago a minha luz para o mundo, no meu fazer e nas minhas relações? Me sinto bem, em paz e livre? Sinto que posso ser quem eu quero ser nos ambientes e nas relações que estou?
Esse Ser muitas vezes aparece adoecido, mas escondido atrás de um Ter que é considerado “bem sucedido”, que são os indicadores de sucesso da nossa sociedade.
O Ser se desenvolve através do Ter e estamos encarnados aqui nesse mundo exatamente para isso, para desenvolver a nossa alma integrada ao que fazemos aqui. A ideia não é se isolar em um Ashram para desenvolver o nosso Ser. É desenvolver no aqui e agora, nos desafios que a vida terrena nos traz.
Então, sim, devemos investir no nosso Ter, em adquirir novas habilidades e competências, uma profissão, uma sustentação financeira, bens que possam trazer as comodidades necessárias, mas lembrar que ele não é o fim, mas o meio para o Ser. E são as perguntas e busca do Ser que devem ser mestres nas nossas vidas.
Com o trabalho de psicoterapia e coaching de propósito de vida, tenho trazido esse olhar para as pessoas, o resgate da essência perdida, da criança ferida e do adulto adoecido que hoje não sabe mais quem é, que muitas vezes se encontra dependente do Ter e de emoções não saudáveis.
Nunca é tarde para fazer esse resgate. Vejo muitas pessoas com seus 30 anos já se questionando e nessa busca, como também vejo nos 40, 50 ou 60 anos.
Sempre é hora de dar voz a esse Ser que muitas vezes foi silenciado pelas expectativas de fora, de indicadores de sucesso que não estavam conectados com a sua essência, mas com padrões impostos pela nossa sociedade e cultura.
Muitas vezes pode parecer que é nadar contra a maré, e é mesmo, porque não é o que é esperado e incentivado nos ambientes e relações. Mas é o que faz valer a vida.
Você já parou para fazer essa reflexão: Se eu pudesse me ver chegando aos últimos dias da minha vida e fosse olhar para a minha jornada aqui na Terra, o que eu gostaria de ver nesse momento? Quais são as pegadas que eu gostaria de ter deixado para trás? Como gostaria de ser visto, reconhecido e lembrado pelas pessoas?
Essas perguntas podem te ajudar a chegar mais perto do que o seu Ser quer te dizer e fazer nesse mundo.
“Cuide do jardim e as borboletas virão até você”
Mario Quintana
Marcela Lempé Madruga
Psicóloga e Coach

Facilitadora do desenvolvimento humano, apaixonada por autoconhecimento e experiências que ampliem a consciência. Mais sobre mim: www.essenciadesenvolvimento.com.br / https://medium.com/@marcelalempe

quinta-feira, 14 de março de 2019

Tempo para Ser


Temos períodos da nossa biografia em que realmente estamos mais inclinados à energia material, dedicando nosso tempo a ter mais coisas, bens, diplomas, prestígio e status.
No 5º setênio, especificamente por volta dos 30 aos 33 anos, começamos um despertar para novas possibilidades de realizações, em que a fonte não é mais só externa, e sim interna.
Vai emergindo a biografia do ser, um desabrochar para um campo mais sutil, trazendo mais profundidade para as experiências e um desejo por mais qualidade naquilo que é vivido. As relações consigo e com o outro começam a ganhar também uma nova importância.
É comum nesta fase passar por acontecimentos marcantes que podem se dar pelo encontro com uma pessoa, obra literária, peça artística e até mesmo experenciar uma situação de crise, doença, que vêm na verdade com o propósito de mostrar um caminho para o autodesenvolvimento, em que valores começam ser profundamente revistos.
No 6º setênio, dos 35 aos 42 anos, o Ser ganha ainda mais potência e nos convida a refletir e sentir sobre:
Quem eu sou realmente?  
Qual o sentido da vida?
Estou a caminho da minha missão?
Vale a pena dar duro assim?
O que faço é coerente com os meus valores?
Neste setênio encontramos a crise da autenticidade e somos apresentados a seguinte questão:
Você quer ser ou ter?
Isto me faz lembrar de uma entrevista que assisti de Pepe Mujica, em que fala sobre o excesso do consumo. Ele diz:
- Quando compramos algo, não compramos com dinheiro e sim com tempo de vida!
Acrescenta, se virarmos máquinas de produzir, consumir e pagar contas, quando percebermos a vida vai ter ido embora. “Não é uma apologia à pobreza e sim à sobriedade”.
E já que estamos falando em sobriedade, fico pensando o quanto estamos sóbrios diante das nossas escolhas, atentos e ouvindo genuinamente o nosso Ser, aquela parte em nós que talvez queira correr menos e ter mais tempo...
Tempo para cultivar afetos como diz Mujica, tempo para contemplar, tempo para respirar, tempo para ser...

Andressa Miiashiro
Psicóloga e psicodramatista.

www.lotustalentos.com.br

quarta-feira, 6 de março de 2019

A essência humana e as coisas


 Há dois filmes que tratam do assunto “ser e ter” de maneira magistral. Meu tio (Mon Oncle, de Jacques Tati, 1958) e A última gargalhada (Der letzte mann de F.W. Murnau, 1924). 
Na comédia francesa, Monsieur Hulot convive com seu sobrinho que vive em uma casa futurista, cheia de artefatos tecnológicos. Ali, nada deve sair do lugar, tudo é regrado e monótono. Em sua casa, as condições externas da limpeza, tecnologia e ordem imperam e a criança não pode ser como é. A criança só sorri quando está com o tio ou em sua vizinhança. O tio mora na periferia e tem uma vida cheia de encontros humanos e calorosos. Nada parece artificial como na vida sofisticada de sua irmã. No mundo do tio, a infância tem seu lugar e o menino pode se sujar, conviver com outros meninos e ser criança. 

No drama alemão, o porteiro de um sofisticado hotel de Berlim ostenta seu cargo por meio de seu casaco cheio de galardões, como o de um general. No entanto, ele já mostra sinais de velhice e acaba sendo substituído. Ele agora deve ocupar o cargo de servente no banheiro, com um simples jaleco branco. Bem no dia do casamento de sua filha, seu casaco/ identidade é retirado dele, dando início a uma série de acontecimentos.
Em ambos, condições externas delimitam e tentam dar forma à essência humana. Nos dois filmes os objetos físicos, como extensões do corpo físico do ser humano, ganham enorme importância e fica muito claro quando os personagens podem ser plenos em suas possibilidades e quando são submetidos pelas coisas.
De acordo com a visão de mundo antroposófica, o ser humano pode ser visto como possuidor de quatro entidades, o corpo físico visível e palpável; o corpo etérico, ou corpo vital; o corpo astral; das sensações e o eu humano, o centro espiritual de identidade.
No filme de Murnau, fica evidente que a entidade física do porteiro, explicitado por seu casaco de galardões toma as vezes de centro espiritual e ele confunde sua aparência com sua identidade. E quando sua função e uniforme são retirados à força, há uma crise de identidade bastante grave. Ele aparenta ser forte e indestrutível dentro do casaco, mas quando o perde, mostra seu corpo físico já debilitado e sem vitalidade.
Em A última gargalhada, as relações humanas podem ser ternas e calorosas, mas também podem ser violentas e cruéis. Há uma intensidade de sentimentos e sensações que se colocam visualmente pela excelente atuação de Emil Jannings como o velho porteiro. Sua verdadeira identidade vai se revelando aos poucos, bem como as reviravoltas de seu destino.
No filme de Tati, a entidade física aparece na figura da casa futurista e tecnológica. Há um excesso de forma, que tolhe os movimentos da criança, cerceia sua espontaneidade e a deixa infeliz. Ali dentro o menino parece doente e triste, sem nenhuma vitalidade, entediado. Seu corpo pode se movimentar somente quando sai de casa e vai visitar a periferia decadente, onde mora o tio. Ali, o menino pode encontrar outras crianças, sujar-se, rir, comer besteiras, pregar pequenas peças e se divertir. Toda essa riqueza de vivências trazem vitalidade e alegria ao menino. Ali, sua natureza espiritual pode ser plena.
Em ambos filmes, fica muito presente a periferia das cidades. Ainda que idealizada e colocada como um lugar ainda com condições mínimas de se viver, fora do centro das cidades é que aparecem as relações humanas mais solidárias. E mesmo que as nossas periferias não sejam como as retratadas nesses filmes, ainda assim há algo nelas que guarda a dignidade humana. Mesmo nos lugares mais brutos e cruéis como as periferias urbanas brasileiras, ainda assim o ser humano consegue encontrar seu eu.

“(…) Uma flor nasceu na rua!Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.Uma flor ainda desbotadailude a polícia, rompe o asfalto.Façam completo silêncio, paralisem os negócios,garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.Suas pétalas não se abrem.Seu nome não está nos livros.É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tardee lentamente passo a mão nessa forma insegura.Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.”

A flor e a náusea, Carlos Drummond de Andrade
Daniel Kulaif
professor de classe no Colégio Waldorf Micael de SP

Tema de Reflexão do Mês

Escolhemos um tema como base de reflexão que será iluminado por profissionais de diversas áreas segundo seu olhar e suas vivências. Colaborações e comentários são bem vindos!

Iniciativas Antroposóficas na ZN

Escola Waldorf Franscisco de Assis (11) 22310152 (11) 22317276 www.facebook.com/EscolaWaldorfFransciscoDeAssis

Projeto Médico Pedagógico e Social Sol Violeta (PMPSSV)

Casa da Antroposofia ZN Rua Guajurus, 222 Jardim São Paulo (11) 35699600