sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Uma boa pergunta, uma amorosa pergunta


Gosto das histórias de vida, vivo de propiciar com que sejam, escritas e compreendidas, tanto por aqueles que contam, como por aqueles que as lêem. Faço isso pela necessidade que tenho de abraçar existências. 
Ora sou eu quem as redijo, ora apenas ouço as pessoas para que se organizem internamente antes de se colocar a escrever.
Ciente da força e do poder da escrita de memórias – que atua em nosso pensar, sentir e querer, mobilizando nosso passado, presente e futuro -, antes que tudo comece, aprendi o valor de só iniciar o processo, de forma ritualística, depois de juntos respondermos a uma boa pergunta, uma que ajude a despertar e elucidar o real motivo de estarmos ali. Digo que eu sou soberana nas perguntas embora o cliente seja soberano na edição.
Pergunto quem ele imagina encontrar na noite de autógrafos e ao terminar o livro qual o sentimento destes leitores. Por quê? Porque é preciso ponderar sobre o que a história escrita pode gerar em nós e no mundo. À luz de Joseph Campbell, aprendi que cada um de nós é herói da nossa jornada e todo herói merece ter sua história contada! Porém, é preciso saber de qual lugar nos comunicaremos e em qual fase da vida estamos, principalmente porque o tempo transforma nosso olhar.
Não importa o quanto erramos, o quanto ficamos estagnados ou amedrontados, se construímos impérios ou reconstruímos famílias. Importa de qual lugar e como, de forma responsável, lidaremos e aprenderemos como aquela biografia e o que ela, por sua vez, nos comunica. Dialogar no íntimo com aquilo que foi vivido é o primeiro passo.
Outra pergunta que trago é sobre a real intenção daquela história ser contada. Peço que ele defina em três verbos o que sustentará a longa jornada de compartilhar uma vida. Um longo silêncio se instala.
Ele se cala, pensativo, mas as partículas do silêncio são reveladoras... Conforme vamos pactuando o propósito daquilo que vamos escrever, é como se um sol tocasse o espaço. Tomados de luz, iniciamos o projeto em plena liberdade, como se tivéssemos atravessados um limiar.
Como no Aconselhamento Biográfico, mergulhamos na história, sem filtros, nem pudores. Gritam-se as dores, os gozos, ouvimos os dragões. Entre luz e sombra, libertamos alguns segredos, outros deixamos amadurecer. Tomados de calor, garimpamos romances, descobrimos que alguns eram de vidro e outros... Aquilo que não se sabe como lidar às vezes torna-se a promessa de todo um capítulo.
Depois desta nobre partilha, vamos arejando a alma, a imaginar formas.  Separamos aquilo que precisou ser contado e não necessariamente precisa ser escrito. Vamos acordando o que sustentamos ver escrito. 
Pois liberdade é também escolher o que calar na escrita, sem onerar o leitor e sem fazer com que o não dito torne-se maldito. Não por manipulação, mas por maturidade e responsabilidade.
Quando ficamos em dúvida ou discordamos, mais uma vez é hora de nos provocarmos com uma boa pergunta, uma amorosa pergunta. Avaliar se a decisão está sendo tomada por medo ou empatia. Feita a reflexão, seguimos.
Afinal, num mundo caoticamente ordenado e volátil, as histórias podem ser violentas, mas sua comunicação não precisa gerar mais violência. Ao contrário, escrevo histórias para ampliar compreensões, inspirar movimentos e pacificar relações.
E você? Escreve para quê?
Seja qual for sua escrita, desejo que ela seja instrumento de paz.

Regina Rapacci
atende como aconselhadora biográfica, é escritora e editora. Entre outras razões, veio ao mundo para eternizar memórias e inspirar histórias


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